Dr. Rafael Rosa

A dislipidemia é um distúrbio caracterizado pelo desequilíbrio nas taxas de colesterol e triglicerídeos no sangue, aumentando o risco de entupimento das artérias e doenças cardiovasculares.

Suas causas incluem fatores genéticos, alimentação rica em gorduras, sedentarismo e doenças como diabetes.

Estima-se que no Brasil, em 2021, 28% da população adulta apresentava a condição, com tendência de crescimento devido ao aumento da obesidade e hábitos alimentares inadequados.

O diagnóstico precoce e o tratamento combinando medicamentos e mudanças no estilo de vida reduzem drasticamente o risco de infarto e AVC.

O Que é Dislipidemia e Porque Ocorre?

A dislipidemia ocorre quando há alteração nos níveis de lipídios no sangue, como o aumento do colesterol LDL (conhecido como colesterol “ruim”), a redução do colesterol HDL (“colesterol bom”) ou o excesso de triglicerídeos.

Esse descontrole pode ser causado por fatores genéticos (primários) ou por condições adquiridas (secundárias), como dieta rica em gorduras saturadas, sedentarismo, diabetes, hipotireoidismo e uso de medicamentos como corticoides.

Formação do Colesterol e LDL

Por exemplo, em pacientes diabéticos, a resistência à insulina aumenta a produção hepática de triglicerídeos, gerando partículas de LDL pequenas e densas que aceleram a formação de placas nas artérias

Imagine suas artérias como tubos: quando o LDL está alto, gordura acumula nas paredes, estreitando o espaço para o sangue passar. Se um coágulo se formar nesse local, pode bloquear completamente o fluxo, causando infarto ou AVC.

As causas são divididas em:

  1. Genéticas: Herdadas dos pais, como a hipercolesterolemia familiar, com níveis de colesterol muito altos desde a infância.
  2. Adquiridas: Dieta rica em frituras, carnes gordas e industrializados, falta de exercícios, obesidade, diabetes e consumo excessivo de álcool.
  3. Doenças Associadas: Algumas condições médicas podem afetar os níveis de lipídios no sangue. Diabetes, especialmente quando não controlada, pode aumentar os triglicerídeos e diminuir o HDL. O hipotireoidismo (glândula tireoide hipoativa) pode aumentar o colesterol LDL. Doença renal crônica e síndrome metabólica também estão associadas à dislipidemia.

Exemplo prático: Uma pessoa que consome fast food diariamente e não pratica atividade física tem maior risco de desenvolver placas de gordura nas artérias, mesmo sem histórico familiar.

Estatísticas Alarmantes no Brasil e no Mundo.

No Brasil, a dislipidemia aumentou de 16,9% (2006) para 22,5% (2016), com projeção de atingir 28% em 2025.

Globalmente, a Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que 39% dos adultos têm colesterol elevado, contribuindo para 4,4 milhões de mortes por ano por doenças cardiovasculares.

Mulheres acima de 55 anos (principalmente pós menopausa) e homens com sobrepeso são os grupos mais vulneráveis.

  • Pessoas com diabetes: 64,6% têm dislipidemia associada.
  • Fumantes e sedentários: 32,6% dos não fumantes e 36,4% dos que praticam exercícios têm taxas controladas.

Porque o Diagnóstico Precoce Salva Vidas?

O acúmulo de LDL nas artérias forma placas de ateroma, que estreitam os vasos obstruindo a passagem de sangue lentamente com o tempo e/ou podem romper, causando coágulos que obstruem totalmente a passagem de sangue.

Sem tratamento, isso eleva o risco de infarto em 58% e de AVC em 40%.

O diagnóstico é simples: exame de sangue mede colesterol total, LDL, HDL e triglicerídeos. Intervenções precoces, como dieta e exercícios, reduzem em 30% a progressão da aterosclerose, seja ela aumentando os valores de HDL ou reduzindo os valores de LDL.

Como a Dislipidemia Causa Infarto e AVC?

O colesterol LDL elevado lesiona a parede das artérias. O corpo envia células de defesa para “limpar” o local, formando uma placa rica em gordura e cálcio. Se essa placa se rompe, forma-se um coágulo que bloqueia totalmente o fluxo sanguíneo.

Placas de Colesterol

Pacientes com LDL > 190 mg/dL têm risco 4 vezes maior de eventos cardiovasculares comparedos a níveis normais.

Embora Infarto e AVC pareçam situações totalmente diferentes, o que acontece em ambos os cenários é o mesmo: obstrução parcial ou total de uma artéria que esteja levando sangue para aquela determinada área.

A única diferença é que no infarto é uma artéria levando sangue para o músculo cardíaco e no AVCi é uma artéria levando sangue para o cérebro.

Infarto Agudo do Miocário: Ocorre quando o fluxo de sangue para o coração é prejudicado, seja parcialmente ou totalmente, seja por placa de ateroma (gordura / calcio) ou por um coágulo em uma artéria coronária (artéria que irriga o coração).

A falta de oxigênio (isquemia) causa danos ao músculo cardíaco (necrose).

Os sintomas de um infarto incluem dor no peito (que pode se irradiar para o braço esquerdo, mandíbula ou costas), falta de ar, náuseas, vômitos e sudorese.

Infarto / Obstrução Arterial por Colesterol

O infarto é uma emergência médica que requer atendimento imediato.

AVC (Acidente Vascular Cerebral): Ocorre quando o fluxo de sangue para o cérebro é interrompido, seja por um coágulo ou placa de ateroma (AVC isquêmico, que é o tipo mais comum) ou pelo rompimento de um vaso sanguíneo (AVC hemorrágico).

A falta de oxigênio causa danos às células cerebrais, levando a déficits neurológicos que podem incluir paralisia, dificuldade na fala, perda de visão e problemas de coordenação.

AVCi / Obstrução Arterial por Colesterol

O AVC também é uma emergência médica que requer atendimento imediato.

Novos Marcadores: ApoB e Lp(a).

A Apolipoproteína B (ApoB) mede todas partículas aterogênicas, sendo mais precisa que o LDL para prever risco.

As diretrizes de 2025 recomendam manter ApoB abaixo de 80 mg/dL em pacientes de alto risco.

Já a Lipoproteína(a) [Lp(a)], genética e não influenciada por dieta, eleva o risco cardiovascular mesmo com LDL normal. A dosagem é indicada para quem tem histórico familiar de infarto precoce.

As diretrizes recentes destacam:

  • ApoB(Apolipoproteína B): Proteína presente em partículas de LDL, melhor indicador de risco que o colesterol total. Valores acima de 130 mg/dL exigem tratamento intensivo.
  • Lp(a)(Lipoproteina a): Tipo genético de LDL que aumenta risco mesmo com colesterol controlado. Níveis acima de 50 mg/dl demandam acompanhamento rigoroso. Exame que deve ser dosado apenas uma vez na vida.

Controle na Prática: Dieta, Exercício e Monitoramento.

Embora a escolhe da opção seja e deva ser sempre individualizada, apenas dieta, tem um peso relativamente pequeno no controle do colesterol. Quando relacionado ao controle de triglicerídeos, aí sim conseguimos uma queda mais importante nos valores apenas com ajuste dietético.

Vemos que apenas com dieta, conseguimos uma alteração de valores discreta, em torno de 10-15% apenas. São mais recomendados para pacientes de perfil de risco mais baixos, e com valores de exames pouco alterados, onde a necessidade de queda também seja discreta.

A Dieta DASH por exemplo prioriza frutas, vegetais e grãos integrais, reduzindo o LDL em 11% em 8 semanas. Exemplo de cardápio: aveia com frutas vermelhas (café da manhã), salada de grão-de-bico (almoço) e salmão grelhado (jantar).

Dieta DASH

Seus pilares incluem:

  1. De 6-8 porções diárias de grãos integrais (aveia, arroz integral).
  2. De 4-5 porções de frutas e vegetais (maçã, espinafre, brócolis).
  3. De 2-3 porções de laticínios low-fat (iogurte desnatado, queijo cottage).
  4. Ênfase em gorduras insaturadas em quantidades controladas (azeite, nozes, abacate).

A Dieta Mediterrânea, rica em azeite e nozes, aumenta o HDL em 5% e reduz o LDL em torno de 10-15%. Baseada em padrões alimentares do sul da Europa, prioriza:

Dieta do Mediterrâneo

Seus pilares incluem:

  1. Peixes gordurosos (salmão, sardinha) ricos em ômega-3.
  2. Azeite de oliva extravirgem como principal fonte de gordura.
  3. Moderação no vinho tinto (1 taça/dia para mulheres, 2 para homens).

Independente do cenário, reduza o consumo de gorduras saturadas (presentes em carnes gordas, queijos integrais, manteiga, óleo de coco e produtos industrializados), gorduras trans (encontradas em alimentos processados, frituras e margarinas), e açúcares adicionados (especialmente frutose, encontrada em refrigerantes, sucos industrializados e doces).

Aumente o consumo de fibras solúveis (presentes em aveia, maçã, pera, feijão e lentilha), que ajudam a reduzir a absorção de colesterol no intestino.

Gorduras saudáveis (como as encontradas em abacate, azeite de oliva extra virgem, peixes ricos em ômega-3, como salmão, atum e sardinha, e oleaginosas, como castanhas, nozes e amêndoas); e alimentos ricos em antioxidantes (como frutas vermelhas, vegetais de folhas verdes escuras e chá verde).

A Atividade Física.

A prática de 150 minutos/semana de atividade física moderada aumenta HDL em 5-10% e reduz triglicerídeos em 20-30%.

Pratique pelo menos 150 minutos de atividade física moderada por semana (como caminhada rápida, natação, ciclismo, dança ou hidroginástica) ou 75 minutos de atividade física vigorosa por semana (como corrida, spinning, treinamento intervalado de alta intensidade ou esportes competitivos como tênnis, volley, beach tennis).

Atividade Física

Exercícios de força (musculação) também melhoram a sensibilidade à insulina, auxiliando no controle lipídico, além de ajudar no ganho de massa muscular, melhorando o metabolismo corpóreo de forma mais intensa durante todo o dia, auxiliando a perda de peso.

Medicamentos: Como Funcionam e Quando Usar?

Em muitos casos, mudanças no estilo de vida não são suficientes para controlar a dislipidemia, especialmente em pessoas com alto risco cardiovascular ou com hipercolesterolemia familiar.

Nesses casos, o uso de medicamentos se torna necessário, já que os valores estimados para queda são muito altos, não conseguindo ser atingido apenas com dieta (os cerca de 10-15%).

As Estatinas são uma classe de medicamentos eficazes e mais comumente utilizadas para reduzir o colesterol LDL, atuando bloqueando uma enzima (HMG-CoA redutase) no fígado que é responsável pela produção de colesterol.

Dentre as várias opções, temos estatinas de baixa, média e alta potência, com poder de queda do LDL entre 10 e 50%; há ainda associações entre estatina com ezetimiba onde a necessidade de queda nos valores precisa ser ainda maior.

Estatinas

Ezetimiba, que reduz a absorção de colesterol no intestino, consequentemente reduzindo os valores de colesterol total e LDL no sangue. Pode levar a uma queda entre 15 e 30%.

Os lactobacillus plantarum (diversas cepas) podem auxiliar na queda do LDL, atuando no intestino e na absorção do mesmo, podendo levar a uma queda de até 20% do LDL.

Outras opções incluem fibratos, que são usados principalmente para reduzir os triglicerídeos e aumentar o colesterol HDL.

Inibidores de PCSK9, que são medicamentos injetáveis usados em casos de colesterol LDL muito alto que não respondem a outras terapias ou como complementar a outras terapias. Funciona alterando o funcionamento de ligação da PCSK9 com o LDL no fígado, reduzindo seus valores. Pode levar a uma queda superior a 50%.

Inibidor PCSK9

Inclisiran, que é um medicamento injetável, age limitando a produção de uma proteína chamada PCSK9 que pode aumentar os níveis de colesterol “ruim”. Ao impedir a sua produção, ele diminui os seus níveis de colesterol “ruim” do seu corpo. Pode levar a uma queda superior a 50%.

Inclisiran

Ácido Bempedóico, que é um novo medicamento, recém liberado para comercialização (ainda não à venda no Brasil na data dessa postagem), vem como mais um medicamento para auxiliar a queda de LDL, e será um medicamento de posologia oral, uma vez ao dia.

Ele atua inibindo da adenosina trifosfato citrato liase (ACL), que reduz o colesterol dse lipoproteínas de baixa densidade (LDL-C) através da inibição da síntese do colesterol no fígado.

Colestiramina, é uma resina de troca, na forma de sache em pó, para diluição em água, que atua no sequestro de sais biliares, com poder de redução de LDL em até 25%.

Ácido Nicotínico pode aumentar o colesterol HDL e reduzir os triglicerídeos e o colesterol LDL. No entanto, possui muitos efeitos colaterais e geralmente não é recomendado como primeira linha de tratamento.

Ômega-3, em doses elevadas, e ai o que fora estudado com efeito comprovado, foram doses altas de EPA e DHA (superiores a 2g / dia) pode ajudar a reduzir os triglicerídeos.

A escolha do medicamento e da potência a ser usada, depende das características individuais do paciente e dos seus níveis de lipídios, associado ao seu risco cardiovascular estimado e de quando seria estimado a porcentagem da queda para atingir as metas pelo seu risco.

FAQ

Q: Falamos sobre ApoB e Lp(a) mas nos medicamentos ainda focam sempre na queda do LDL, porque?

R: Até o momento nenhum medicamento foi eficar na queda dos valores dessas moléculas, embora sejam utilizadas como marcadores e têm um peso cada vez maior quando comparados ao LDL, ainda os utilizamos como possível fator complicador, talvez aumentando o poder de medicamento na queda do LDL quando um ou outro (ApoB ou Lp(a)) estão presentes e aumentados.

Q: Em caso de queda do LDL para valores abaixo da média de necessidade, causariam algum problema?

R: Não. Até o momento não foram encontrados complicações, seja hormonal (hormônios dependentes de colesterol) ou outra forma, relacionados a queda de LDL maior que o esperado em caso de tratamento.

Q: Então a dieta não controla colesterol?

R: Sim, uma dieta mais equilibrada ajuda a baixar os valores de colesterol total e ruim (LDL) por exemplo, e aumentar o colesterol bom (HDL), mas uma vez que a produção de LDL é no fígado e não exclusivamente pela ingesta de precursores desse colesterol. Apenas evitar a ingesta não é suficiente em alguns casos para se atingir os valores necessários.

“Toda decisão deve ser tomada em conjunto com seu médico, e cada paciente é único. Cada estratégia deve ser levada em consideração as informações anteriores e as particularidades de cada paciente. O texto é única e exclusivamente informativo”.

E é muita coisa, não? Daria pra cuidar bem de tudo isso em 10 minutos?

Dr Rafael Rosa - Cardiologia Cardiologista

Cardiologia em Limeira – SP

O Dr. Rafael Rosa atua em Cardiologia. Você deve ser o maior conhecedor do seu corpo e dos seus problemas, e merece ser cuidado com atenção, com tempo e carinho adequados.

O Dr. Rafael Rosa atua em Cardiologia. Você deve ser o maior conhecedor do seu corpo e dos seus problemas, e merece ser cuidado com atenção, com tempo e carinho adequados.

Com experiência mista em urgência e emergência desde 2013, e atuando na área cardiológica desde 2019 nos setores da cardiologia, unidade de terapia intensiva cardíaca na Santa Casa de Limeira. Associado a isso, a união de equipe de saúde multidisciplinar do Instituto Evolução, trazendo o melhor dos dois mundos, da urgência e emergência ao consultório, contamos com o melhor para sua saúde cardiovascular e qualidade de vida.

Referências:

Atualização da Diretriz Brasileira de Dislipidemias e Prevenção da Aterosclerose – 2017 – SBC

2023 ESC Guidelines for the management of cardiovascular disease in patients with diabetes.

2019 Guidelines on Dyslipidaemias (Management of) – ESC Clinical Practice Guidelines.

Destaques da Diretriz de Prática Clínica da Associação Americana de Endocrinologia Clínica de 2025 sobre Manejo Farmacológico de Adultos com Dislipidemia.

Dieta Dash

Dieta do Mediterrâneo

Outros Artigos

Artigo Sobre Saúde Cardiovascular da Mulher.

Artigo Sobre Dor no Peito e Doença Arterial Coronariana.

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